domingo, 30 de janeiro de 2011

Inércia


Os pássaros começavam a cantar. O sol começava a nascer, e com isso o dia começava a clarear. As coisas estavam mudando: Em todo o mundo folhas do calendário eram arrancadas, a noite se tornava dia e o frio se tornava quente. Mas enquanto tudo isso acontecia, Maria continuava parada. Na mesma posição em que passara toda a noite. Desperta.
Ela tinha 12 anos, e tinha passado toda a noite deitada em sua cama, de barriga para cima, com os olhos bem abertos, os pés juntos e as mãos cruzadas no peito. Mas entre suas mãos e o seu coração tinha um livro. O livro com sua história preferida e que Maria escondia. Porque mostrá-lo lhe transformaria numa criatura tão estranha quanto o personagem principal de seu livro preferido.
O certo seria, nesta fase de sua vida, ser apaixonada pelas cinderelas, seus príncipes encantados e suas histórias de amor. Mas ao invés disso era pelo cisne que achava que era um pato que Maria era apaixonada. E enquanto Maria revivia em sua mente, pela milésima vez, desde a última noite, suas passagens favoritas da história, ouviu os passos de sua mãe no corredor e imediatamente mudou de posição e fingiu dormir.
Poucos segundos depois a mãe de Maria chegou no quarto com a intenção de despertá-la para ir para a escola, onde aprenderia alguma coisa nova, brincaria com seus amigos e fingiria gostar das cinderelas, mesmo querendo ser um cisne e descobrir que vivia entre patos.
Mas todos eram tão iguais. E não vendo a possibilidade de ser um cisne, precisava fingir ser pato. Ou em uma perspectiva mais otimista, se transformar em um.
Maria levantou-se, se arrumou, testou o sorriso no espelho e saiu, com uma única meta na cabeça: Correr para que anoitecesse o mais rápido possível e pudesse voltar para seu quarto, sua cama e seu livro.
Algumas horas depois, os pássaros começavam a cantar. O sol começava a nascer, e com isso o dia começava a clarear. As coisas estavam mudando: Em todo o mundo folhas do calendário eram arrancadas, a noite se tornava dia e o frio se tornava quente. Mas enquanto tudo isso acontecia, Maria continuava parada. Ora adormecida, ora desperta. Sempre com seu livro no peito, entre suas mãos e o coração.
Enquanto tudo mudava sempre, Maria continuava sempre parada esperando que alguma coisa mudasse dentro, ou fora, dela.

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